A última matéria da Veja sobre a esposa de Michel Temer teve uma repercussão enorme na internet. Ela se tratava de criar um estereótipo de primeira-dama perfeita, afinal, a Marcela é formada em direito, porém dona de casa por opção, mãe, recatada e bela (ou melhor, linda)! Mas a verdade é que se ela não fosse tão bela, trabalhasse fora e gostasse de usar roupas extravagantes, não faria a menor diferença na vida de ninguém.
Pensei se deveria abordar um assunto tão polêmico como esse aqui, afinal “futebol, religião e política não se discute” mas a partir do momento em que o assunto se tornou o papel da mulher na família e a postura de cada membro dentro dela, vi que precisamos falar sobre isso. Sobre a cultura machista, o feminismo, a religiosidade e a minha visão sobre a família do século XXI. (e não é questão de que “hoje em dia tudo é machismo”).
Publiquei uma mensagem de cunho feminista, e não podia ser diferente… gerou uma discussão muito rica (e também preconceituosa por parte de algumas pessoas). Essa foi uma entre as mais de 77 mil publicações com a hashtag #belarecatadaedolar (nem imagino onde esse número vai parar).
É importante que quem não concorda não se cale, pois precisamos entender como as pessoas enxergam a cultura machista, o feminismo e absorver o máximo de cada lado. O ideal é que todas as pessoas (do dois lados) estivessem abertas a ouvir e não fizessem discurso de ódio.
Já falei diversas vezes aqui. Eu não tomo partido a ponto de ficar cega. Gosto de ouvir, ponderar e encontrar um equilíbrio.
Não posso discordar do grupo (geralmente mais conservador e ligado à religiosidade) que defende que a mulher é muito importante e é a base da família, mas o que o feminismo defende é que essa mulher NÃO TEM QUE ser do lar e ser recatada para ser respeitada ou boa mãe/esposa. O que o feminismo prega é que as mulheres podem escolher trabalhar fora, escolher o que vestir, escolher o que quiserem assim como os homens podem. Que a feia e a bela não devem ser julgadas por sua aparência, assim como quem usa saia na altura dos joelhos, no pé ou mini-saia também não.
A grande preocupação desse grupo que foi contra a publicação e é contra o feminismo é que famílias fiquem “abandonadas”, mas isso só acontece quando ambos os responsáveis, geralmente o pai e a mãe, não assumem seu papel como educadores e são omissos. Existem famílias em que a figura central e “do lar” não é a mãe e são muito bem resolvidos e felizes, com filhos bem orientados.
A mãe pode trabalhar fora e ser presente. O pai pode trabalhar fora e ser presente. Outros podem ser “do lar” e serem ausentes. O quanto cada criança vai ser bem orientada não está diretamente relacionada às horas em que ela está com a mãe, (ou à roupa que ela veste), mas sim ao quanto ela recebe de amor, atenção, acolhimento, proteção e o quanto os adultos da casa conversam, dialogam, toleram e dão BONS EXEMPLOS.
Sobre a publicação, uma amiga e seguidora resumiu perfeitamente:
Particularmente não vejo nada demais em ser bela, recatada e do lar. Na verdade acho que cada uma deve e pode ser o que quiser. Para mim o que mais me incomoda em relação a Veja é o que está por trás dessa matéria, por trás desse título. É o estereótipo. Deixo claro q não estou falando nem vou falar nada sobre política. A Veja e outras mídias já haviam agido assim anos atrás, na primeira posse da Dilma, num momento em que o destaque seria o país eleger a primeira mulher, o destaque foi para a beleza da mulher do vice… (se não lembram, procurem na internet). A questão de colocar em evidência a beleza acima das conquistas das mulheres, a questão de destacar um exato tipo de beleza… A discussão é muito profunda, e olha q nem estamos abordando política. O assunto é sério e pode ser cansativo para muitos, mas é necessário. Nós mulheres matamos um leão por dia para mostrar nosso valor, estejamos onde estiver, em casa ou no trabalho fora, na escola, na faculdade, num esporte, onde for. E ainda temos q lutar para fugir de padrões q nos impõe vergonhosamente e descaradamente todos os dias. Mas somos fortes e juntas, juntas mesmo, podemos tudo. Esse debate é muito bom.
Agora vamos falar de esteriótipos?
Tenho uma amiga feminista que trabalha fora (assim como o marido). Se envolve em discussões sobre empoderamento feminino, causas LGBT, respeito às diferenças e as escolhas individuais. Vocês criaram uma imagem dela? Imaginaram uma “bicho grilo machona”?
Agora vou descrevê-la. É professora, só usa salto bem alto, maquiagem, batom vermelho. Queria fazer um ensaio sensual como presente de 40 anos (a si mesma). Ainda arrisco dizer que deve usar biquíni fio dental, o que não muda em nada a capacidade de educar e transmitir conhecimento. Bem casada e muito amada. O marido é quem prepara a mochila da filha pro ballet, lava a louça, e divide todas as responsabilidades na rotina e educação dela. Tem algum problema com essa família? Claro que não! Eles têm tudo para continuarem felizes e sem amarras, sem cobranças, sem desgastes. Essa criança cresce em um lar onde os pais se respeitam, se completam e se amam.
A mulher pode ser “do lar” se ela acha que a vocação dela é essa e se ela vai ser mais feliz sendo dona de casa. Essa é uma OPÇÃO dela! Sim, ela tem o poder de escolher graças à luta das feministas há décadas.
Outras mulheres preferem de trabalhar fora. Gostam da individualidade, da autonomia, de tratar de assuntos profissionais, e nem por isso deixam de educar, de serem firmes, amáveis e zelosas com suas famílias.
Nenhuma é pior ou melhor. Nenhuma deveria ser julgada por suas escolhas.
O que o feminismo vai contra é a distinção do sexo no poder de escolha. É o fato de os meninos PODEREM “ser meninos” (correr, brincar e rolar na lama) e as meninas TEREM QUE “ser meninas” (brincar de boneca, de casinha e se comportar como tal).
O que o feminismo quer que todos enxerguem é que não está tudo bem o homem tradicionalmente jogar video-game, ler um jornal ou dormir enquanto a mulher lava a louça do almoço e que, assim como o homem pode sair para jogar futebol toda semana enquanto a mulher está em casa com os filhos, o homem deveria ficar com os filhos para a mulher sair com as amigas. Simples assim, revezando. Igualdade.
O problema é que muitas mulheres acham que o papel delas é somente ficar em casa (e que quem não o faz está estragando a família -> pensamento machista) e que não poderiam chefiar grandes empresas. Muitos homens as subestimam. Assim como muitos homens não se esforçam para serem adultos e donos de casa melhores e muitas mulheres os subestimam e acham que eles não são capazes de fazer o mesmo que elas fazem no lar. Todos são capazes de tudo se quiserem e se esforçarem.
Crescemos em uma sociedade que não vê nada de errado nisso e o problema é justamente esse. É cultural, mas é machista. E enxergar a desigualdade nas pequenas coisas é um exercício diário.
Menos julgamentos, menos preconceito, menos discursos de ódio.
Mais união, mais respeito às escolhas alheias e mais amor, por favor. Lembrem-se que estão educando uma nova geração e precisamos de pessoas mais tolerantes.